domingo, 12 de outubro de 2008

Para Hume, causa e efeito. Para Skinner, previsão, controle e interpretação.

“Quando qualquer objeto ou evento natural se apresenta, é impossível para nós, por meio de qualquer sagacidade ou argúcia, descobrir ou mesmo conjecturar, sem experiência, qual evento resultará daquele, ou conduzir a nossa previsão para algo além do objeto que está imediatamente presente para a memória e os sentidos. Mesmo após uma situação, ou um experimento, em que tenhamos observado um evento particular vir em seguida de outro, não estamos autorizados a formar uma regra geral, a antecipar o que acontecerá em casos semelhantes. É justo que se considere uma temeridade imperdoável julgar todo o curso da natureza a partir de um experimento singular, apesar da sua precisão e certeza. Mas quando uma espécie particular de eventos sempre esteve, em todos os casos, conjugada com outra, não temos nenhum escrúpulo em prever um desses eventos a partir da aparição do outro, empregando aquele raciocínio que, sozinho, nos assegura de qualquer fato ou existência. Então, chamamos um objeto de Causa; o outro de Efeito. Supomos que haja alguma conexão entre eles; alguma força, no primeiro, pela qual ele produz infalivelmente o segundo, operando com a maior certeza e a mais forte necessidade. (...) Quando dizemos que um objeto está conectado a outro, isso significa apenas que eles adquiriram uma conexão em nosso pensamento. (...) Nenhuma conclusão pode agradar mais ao ceticismo do que as descobertas a respeito dos limites tênues e estreitos da razão e da capacidade humana”.

Hume aponta para a descrição, baseada na indução, dos fenômenos naturais. A psicologia científica também está preocupada com a descrição de uma parte da natureza. A análise do comportamento, segundo a fudamentação behaviorista radical, está preocupada com a descrição do comportamento humano - o que pode incluir previsão, controle e interpretação. Hume entende que tal proposta é limitada no que diz respeito à razão e à capacidade humana, mas tal entendimento pode ser discutido de acordo com as implicações derivadas do acúmulo de conhecimento científico acerca dos fenômenos humanos.
Com relação à previsão, dada a observação do comportamento pode-se chegar a conclusões gerais - leis gerais - às quais todo comportamento está sujeito. O comportamento pode ser descrito como a relação entre as respostas de um organismo e os estímulos do ambiente. Pode-se falar de um comportamento respondente, que é eliciado por um estímulo condicional ou incondicional, de um comportamento operante, que tem sua probabilidade alterada pelas conseqüências que produz, e ainda de outras formas de comportamento, como os adjuntivos ou supersticiosos.
A previsão de um comportamento leva a tecnologias de controle. Se uma lei do comportamento dita que um estímulo X elicia uma resposta Y, o cientista do compormento dispõe, dessa forma, de uma ferramenta de controle. Basta a manipulação de tal estímulo para que a resposta correspodente seja emitida. Se outro enunciado desreve que uma dada consequência altera a probabilidade de emissão de uma resposta, se torna possível selecionar aquelas respostas de interesse especial do cientista e que serão alvo do seu estudo.
Porém a interpretação destas formas de previsão e controle tornou-se livre da inferência a forças que conectam os eventos. O behaviorismo radical assume que a relação explicativa entre antecedentes ou consequentes e a resposta é descritiva. Segundo a abordagem, tal explicação é suficiente.
Como foi aqui brevemente discutido, a construção de conceitos acerca do comoprtamento humano vem clarificando o conhecimento da razão e da capacidade humana. Segundo os paradigmas da ciência, que implicam no estudo sistemático partindo da simplicidade em direção à complexidade, hoje muito se tem a dizer acerca da previsão, controle e interpretação do comportamento humano.

sábado, 27 de setembro de 2008

Confissões, Santo Agostinho; confusões, Behaviorismo Radical.

"Que é, pois, o tempo? Quem poderá explicá-lo clara e brevemente? Quem o poderá apreender, mesmo só com o pensamento, para depois nos traduzir por palavras o seu conceito? E que assunto mais familiar e mais batido nas nossas conversas do que o tempo? Quando dele falamos, compreendemos o que dizemos. Compreendemos também o que nos dizem quando dele nos falam.
O que é, por conseguinte, o tempo? Se ninguém mo perguntar, eu sei. Se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei. Porém, atrevo-me a declarar, sem receio de contestação, que, se nada sobreviesse, não haveria tempo futuro, e se agora nada houvesse, não existiria o tempo presente.
De que modo existem aqueles dois tempos - o passado e o futuro - se o passado já não existe e o futuro ainda não veio? Quanto ao presente, se fosse sempre presente, e não passasse para o pretérito, já não seria tempo, mas eternidade.
Mas se o presente, para ser tempo, tem necessariamente de passar para o pretérito, como podemos afirmar que ele existe, se a causa da sua existência é a mesma pela qual deixará de existir? Para que digamos que o tempo verdadeiramente existe, porque tende a não ser?"


Agostinho traz à tona uma grande dificuldade relacionada ao comportamento verbal: descrever o ambiente de acordo com propriedades de estímulos subjetivas. É sabido que o comportamento verbal fica sob controle, predominantemente, da comunidade verbal. Porém, temos que nos haver com as limitações da comunidade em treinar a cada falante. Acredito ser relevante discutir um pouco sobre comportamento verbal, propriedades de estímulos na abstração e a subjetividade do ponto de vista do behaviorismo radical.
Comportamento verbal é toda ação indireta sobre o ambiente. Indireta no sentido de que o primeiro efeito do comportamento é sobre as outras pessoas e são estas que medeiam as consequências ambientais últimas. A comunidade verbal, a cultura, treina cada pessoa para a emissão deste tipo de comportamento - o que se dá de acordo com os interesses da comunidade. Tal treino pode apresentar certas deficiências e algumas delas são agora apontadas por Agostinho com relação à descrição de acontecimentos (passados, presentes e futuros).
Um estímulo qualquer, como um objeto ou um acontecimento, pode ser descrito por uma pessoa. Eu posso dizer "Esta bola é azul" ou "Guardei aquela bola azul ontem em seu armário" desde que haja contingências relevantes para esse comportamento. A bola azul possui muitas propriedades: é redonda, tem uma certa textura, uma cor, serve para alguma coisa (jogar, fazer fisioterapia ou prender objetos) e foi guardada ontem. Mas nem todos as propriedades de estímulo controlam meu comportamento de falar: basta dizer que ela é azul e que foi guardada ontem. Quando alguns estímulos, e não outros, controlam o comportamento, dizemos que estamos abstraindo. Abstraímos quando falamos apenas de conceitos sem dar exemplos e abstraímos quando agrupamos muitos objetos de acordo com alguma propriedade comum. Abstraímos, por exemplo, ao agrupar certos acontecimentos como "passado" de acordo com a propriedade "eles já aconteceram" e outros acontecimentos como "futuro" de acordo com a propriedade "eles ainda vão acontecer". E abstraímos mais ainda ao chamar passado e futuro de tempo.
Podemos entender a subjetividade como o comportamento sob controle de propriedades de estímulos que não são muito claras. Se alguém perguntar sobre onde está a bola azul e a outra pessoa responder "não sei", ela pode estar sob controle de uma propriedade de estímulo menos óbvia, como o preço da bola ou a importância que ela tem - e isso faz com que a pessoa não a queira emprestar. É muito subjetivo emprestar uma bola; nem todo mundo fica sob controle do preço ou da importância de um objeto - e tem gente que empresta até suas jóias.
Todos esses conceitos culminam na análise de algo do que o autor está apresentando: como considerar os eventos presentes como tempo, uma vez que "considerar" está sob controle de estímulos abstratos, como a ocorrência passada ou futura destes eventos? Isso ocorre provavelmente porque a comunidade verbal treinou o autor a descrever e a valorizar os eventos passados e futuros - e deve ter falhado em ensiná-lo a descrever, valorizar os acontecimentos presentes e chamar isso de tempo. Talvez porque o valor do tempo presente é uma propriedade de estímulo mais confusa e difícil de ser descrita. É possível que os leitores consigam descrever e valorizar o tempo presente sem as dificuldades de Agostinho; ou talvez nem sejam tão sensíveis ao problema que ele aponta - o que é muito subjetivo.

quinta-feira, 17 de abril de 2008

Fenomenologia do Espírito - Hegel

"Mas esse movimento da consciência-de-si em relação a uma outra
consciência-de-si se representa, desse modo, como o agir de uma (delas). Porém
esse agir de uma tem o duplo sentido de ser tanto o seu agir como o agir de
outra; pois a outra é também independente, encerrada em si mesma, nada há nela
que não seja mediante ela mesma.
A primeira consciência-de-si não tem diante
de si o objeto, como inicialmente é só para o desejo; o que tem é um objeto
independente, para si essente, sobre o qual portanto nada pode fazer para si, se
o objeto não fizer em si o mesmo que ela nele faz. O movimento é assim, pura e
simplismente, o duplo movimento das duas consciências-de-si. Cada uma vê a outra
fazer o que ela faz, cada uma faz o que da outra exige – portanto faz somente
enquanto a outra faz o mesmo. O agir unilateral seria inútil; pois, o que deve
acontecer, só pode efetuar-se através de ambas as consciências."
Sobre Hegel: http://pt.wikipedia.org/wiki/Hegel

Hegel apresenta considerações sobre a consciência-de-si, o que pode ser discutido segundo a perspectiva analítico-comportamental do auto-conhecimento. Ainda pode ser relevante abordar o processo de condicionamento de estímulos, a aprendizagem vicariante e a competência social.
O auto conhecimento tem origem social e surge se uma comunidade verbal faz perguntas do tipo “O que você fez?”, “O que você está sentindo?” ou “Do que você mais gosta?”. Ou seja, para promover o auto-conhecimento, uma consciência-de-si deve se relacionar com outras consciências-de-si.
Quando as pessoas participam da vida de alguém, intermediando outros reforçadores incondicionais, “ter pessoas participando da sua vida” pode se tornar um estímulo reforçador condicional. Por isso a primeira consciência-de-si não tem diante de si um objeto – este ainda não se tornou um estímulo reforçador.
Se uma pessoa faz algo que viu outra pessoa fazendo e, assim, passa a produzir certos reforçadores, ela pode aprender a se comportar "olhando". Isso se chama aprendizagem vicariante. Por isso Hegel pôde exemplificar o processo em que uma consciência-de-si faz o que a outra faz.
A comunidade verbal, então, pode estabelecer-se como uma eficaz agência para ensinar às pessoa quais comportamentos serão bem sucedidos naquela comunidade. Ela pode definir a competência social. Dessa forma, um agir unilateral, sem contato com as outras consciências-de-si, seria mesmo inútil.
Parece, de uma forma geral, que as considerações de Hegel estão de acordo com concepções analítico-comportamentais. Porém, o texto é carregado de obscuridade. Muito do que é chamado de consciência-de-si poderia ser chamado de comportamento consciente e grande parte do que é apontado como fenômeno universal, muito provavelmente se trata tão somente de eventos particulares.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

Mênon, de Platão

Trata-se de um escrito de Platão acerca da discussão entre Sócrates e Mênon, em que Sócrates defende o inatismo, doutrina filosófica em que as pessoas possuem um saber interior que apenas emerge devido às lembraças ocorridas no contato com o mundo exterior. Nesta passagem, Sócrates inquire um servo de Mênon com questões acerca da geometria, e leva o rapaz a concordar com os apontamentos de Sócrates sobre a definição do Teorema de Pitágoras. Sócrates usa esta situação para convencer Mênon de que o jovem servo possui conhecimento inato sobre geometria, dado que este jamais havia estudado o Teorema. Seguem alguns trechos.

"Sócrates: (...) Chame um dos seus serviçais, o que você quiser, para ajudar na minha demosntração. (...) Agora observe atentamente se ele parece lembrar ou se aprende comigo. (...) Diga-me, rapaz, sabe que esta figura é um quadrado?
Rapaz: Sei. (...)
Sócrates: Agora, se este lado tivesse dois pés e aquele também, quantos pés tera o quadrado? (...) Quantos são duas vezes dois, conte e me diga.
Rapaz: Quatro, Sócrates.
Sócrates: E pode haver outra figura duas vezes maior que esta mas do mesmo tipo, também com todos os lados iguais?
Rapaz: Pode.
Sócrates: Então quantos pés terá?
Rapaz: Oito.
Sócrates: Agora tente me dizer quanto medirá cada lado dessa figura. Este aqui tem dois pés; quanto terá o lado do outro quadrado que tem o dobro do tamanho?
Rapaz: Sem dúvida o dobro, Sócrates.
Sócrates: Está observando, Mênon, que não ensino coisa alguma ao rapaz, mas apenas lhe faço perguntas? E agora ele supõe que sabe o tamanho da linha para traçar um quadrado de oito pés, ou não acha que supõe? (...) Agora observe o progresso dele ao lembrar com o uso adequado da memória. Diga-me, rapaz, a seu ver obtemos o dobro da área com uma linha que tenha o dobro da sua extensão? A área a que me refiro não é comprida numa direção e curta em outra; deve ser igual em todas as direções, como esta, mas ter o dobro do tamanho: oito pés. Agora veja se ainda acha que obtemos isso com uma linha do dobro do tamanho.
Rapaz: Acho.
Sócrates: Bem, se acrescentamos aqui outra linha do mesmo tamanho, dobramos esta?
Rapaz: Claro.
Sócrates: E você diz que teremos uma área de oito pés com quatro linhas deste tamanho?
Rapaz: Sim.
Sócrates: Então vamos traçar o quadrado, com quatro linhas aguais desse tamanho. Teremos então, a seu ver, a figura de oito pés, não é?
Rapaz: Certamente.
Sócrates: E contidos neste quadrado não temos outros quatro iguais à área de quatro pés?
Rapaz: Sim.
Sócrates: Então qual é o tamanho total? Quatro vezes aquela área, não é?
Rapaz: Deve ser.
Sócrates: E quatro vezes são o dobro?
Rapaz: Não, claro que não.
Sócrates: E quanto são?
Rapaz: O quádruplo. (...)
Sócrates: Mas com que linha vamos traçar isso? Tente nos dizer exatamente; mas, e não conseguir calcular apenas mostre que linha será.
Rapaz: Bem, Sócrates, palavra que nao sei.
Sócrates: E agora, Mênon, vê que progressos ele já fez em termos de memória? De nício não sabia que linha forma a figura de oito pés e mesmo agora não sabe, mas ntes achava que sabia e respondeu confiante como se soubesse, sem ter consciência das dificuldades; ao passo que agora sente a dificuldade em que se encontra e, além de não saber, não acha mais que sabe. (...) E sem dúvida prestamos-lhe alguma assistência, parece, para que descubra a verdade da questão, pois agora ele prosseguirá alegremente na busca do que não conhece, ao passo que antes se apressaria em supor que tinha razão em dizer, diante de todos e quantes vezes fosse, que o dobro da área deve ter um lado com o dobro do tamanho. (...) Agora observe como, em conseqüencia dessa perplexidade, ele vai prosseguir e descobrir uma coisa em investigação conjunta comigo, embora eu meramente faça perguntas e não ensine. E fique atento para ver se em algum momento lhe ensino ou explico algo, em vez de questionar as suas opiniões. Diga-me, rapaz: aqui temos um quadrado de quatro pés, não temos? Está entendendo? (...) E aqui, juntamente a ele um quadrato igual, certo? (...) E aqui um terceiro, igual aos outro dois, não é? (...) E agora vamos preencher esta área vazia no canto, está bem? (...) Então devemos ter aqui quatro áreas iguais?
Rapaz: Sim.

Sócrates: Ora bem, quantas vezes a área total é maior do que essa outra?
Rapaz: Quatro vezes.
Sócrates: Mas deveria ser duas vezes, lembra-se?
Rapaz: Claro.
Sócrates: E esta linha traçada de ângulo a ângulo dos quadrados não divide em duas a área de cada um? (...) E não temos quatro linhas iguais encerrando essa área?(...) E não temos quatro linhas encerrando essa área? (...) Agora repare qual é a área deste quadrado. (...)
Rapaz: Oito pés.
Sócrates: E com que linha foi traçada?
Rapaz: Com esta.
Sócrates: Com a linha que corta o quadrado de quatro pés de um ângulo a outro?
Rapaz: Sim.

Sócrates: Os professores chamam essa linha de diagonal. Se diagonal é o seu nome, então, segundo você, servo de Mênon, o dobro da área é o quadrado da diagonal.
Rapaz: Sim, certamente, Sócrates.
Sócrates: O que achou, Mênon? Ele deu alguma opinião que não correspondesse ao seu próprio pensamento?
Mênon: Não, todas as opiniões foram dele.
Sócrates: Mas veja, ele não sabia, como dissemos há pouco.
Mênon: É verdade.
Sócrates: No entanto, ele tinha essas opiniões dentro dele, não tinha?
Mênon: Tinha.
Sócrates: Então aquele que nada sabe de assunto algum, seja qual for, pode ter opiniões verdadeiras sobre assuntos que desconhece por completo? (...) Ora, se sempre o teve, sempre foi sabedor; e se o adquiriu em algum momento, não pode ter sido nessa vida. Ou será que algém lhe ensinou geometria? Veja, ele pode fazer o mesmo com a geometria interia ou qualquer campo do conhecimento. Ora, alguém lhe ensinou tudo isso? Você com certeza deve saber, especialmente porque ele nasceu e foi criado em sua casa. (...) Portanto, se em ambos os períodos - quando ser humano e quando não - ele tinha dentro de si opiniões verdadeiras que precisam apenas ser despertadas pelo questionamento para se tornarem conhecimento, sua alma então deve ter tido sempre essa ciência? Pois é claro que ou ele sempre foi um ser humano ou não foi. (...) E se a verdade de todas as coisas que existem está sempre em nossa alma, então a alma deve ser imortal? De modo que é preciso criar coragem e se esforçar em procurar e recuperar seja lá o que for que hoje porventura desconhecemos, isto é, não lembramos? "
Neste texto de Platão, há dois aspectos sob os quais irei digredir. O primeiro é a metodologia de ensino de Sócrates - que ele insiste em dizer não se tratar de ensino. E o segundo é a natureza do conhecimento apresentada por ele.
Não selecionei estes recortes do texto aleatoriamente. Algo no método pedagógico de Sócrates me chamou a atenção. Reparem o seu diálogo com o jovem rapaz, servo de Mênon. Se tiverem acesso ao texto original, reparem também que ele dialoga da mesma forma com Mênon e com uma possivel audiência (talvez o leitor ou seus discípulos presentes). O questionamento socrático parece exercer um efeito muito interessante sobre os interlocutores. Parece que a condução do questionamento torna a resposta algo muito valioso, talvez a resposta se torne até um estímulo reforçador para a pessoa que responde. Enquanto pergunta, Sócrates estabelece a resposta como um estímulo reforçador. Dessa forma, as perguntas de Sócrates podem ser entendidas como Operações Estabelecedoras. E a pessoa responde.
E mais do que isso, Sócrates também controla as respostas. Ele não faz perguntas sem apontar ou induzir as respostas: ele se utiliza de figuras geométricas, recurosos de linguagem, e creio que modula sua voz e suas e expressões faciais enquanto pergunta. Ele dá as respostas certas. Habilmente, Sócrates também seleciona as respotas corretas do interlocutor e descarta as incorretas. Ele usa reforço diferencial. Vai modelando a discussão. Ele afirma não estar ensinando. De fato, ele não está discursando. Mas não percebe que as conseqüências que ele planeja para as respostas de seus interlocutores selecionam as repostas correstas e as aumenta de freqüência. Ele não percebe que este método de fortalecimento do repertório verbal é talvez o melhor método de ensino que pode haver.
Apesar de afirmar que está questionando, ele está implementando uma tecnologia de ensino muito eficiente e sutil: ela conta com o principio de seleção de comportamentos por conseqüências elaborado per Skinner.
Quando Sócrates aponta sobre a natureza do conhecimento, pode-se apontar inúmeros problemas com relação a uma compreensão behaviorista radical. A primeira confusão que Sócrates faz é a substacialização do conhecimento - ele trata os comportamentos ligados ao conhecer como substantivos (saber, conhecimento, memória, sabedoria). Depois, traz a discussão para o campo da metafísica, dizendo o conhecimento seria de origem imaterial. E também teoriza sobre a interiorização do conhecimento. A argumentação de Sócrates está baseada na hipóstese negativa.
A tese de PHD de Skinner, a Operacionalisação dos Termos Psicológicos, trata de fazer o caminho inverso do proposto por Sócrates em sua concepção da natureza do conhecimento. E tradicionalemnte, a psicologia tem tratado as atribuições humanas em termos de substantivos. Ao invés de estudar a relação entre respostas e variáveis ambientais, a psicologia tradicional tem voltado as atenções para a memória, o inconsciente, o conhecimento, a doença mental e personalidade. A proposta de Skinner foi a de abandonar as substantivações e adotar o estudo das atribuições humanas em termos de verbos, abordando a relação entre nossas ações e seus efeitos no ambiente. Por exemplo, para estudar o conhecimento, sugere-se que se estude o falar, o pensar, o perceber, os estímulos prentes quando dadas essas ações, as conseqüências dispostas pela comunidade verbal para esses comportamentos, a natureza social deles, etc. Quantas pessoas já reparam na natureza social do comportamento de lembrar? Preste atenção a partir de hoje: nós geralmente agradamos muito uma criança quando lembra nosso nome ou quando nomeia adequadamente um objeto e certamente a corrigimos e desaprovamos quando faz o oposto. Para Skinner, são essas relações (entre lembrar, elogios e desaprovações) que devem ser estudadas. Não a memória. Skinner considera esses substantivos como ficções explanatórias, conceitos convenientemente criados pela comunidade verbal para explicar certos fenômenos complexos e incompreendidos em observações casuais.
A discussão da física versus a metafísica ainda se apresenta na psicologia sob a forma de estudo da mente versus estudo do comportamento. Segundo uma concepção científica atual, esse dualismo cartesiano não é consebível. E foi Skinner quem rompeu com a tradição psicológica negando não apenas o estudo da mente, mas questionando a existência de uma mente iniciadora de comportamentos. Sem dúvida nos comportamos verbalmente e falamos sobre muitas coisas. Também sentimos muitas coisas e nosso corpo não está equipado para que possamos descrever exatamente que eventos estão envolvidos no nosso comportamento perceptual, mas qualquer explicação que recorra a mente está superada. Devemos estudar o comportamento verbal e a fisiologia da percepção para entendermos o que antes era obejto de estudo da psicologia mentalista.
A interiorização do conhecimento, proposta por Sócrates, remete à crítica ao mentalismo. A crítica ao mentalismo se trata da crítica à concepção de homem como iniciador da ação. Sócrates argumenta que o homem possui o conhecimento dentro de si e que a partir daí ele poderá demonstrá-lo. Esta colocação obscurece o estudo da real origem dos comportamentos relacionados ao conhecer (ouvir, perceber, falar, lembrar, etc.) e tem grandes implicações práticas. Esses comportamentos estão sujeitos a leis operantes e assim devem ser estudados. Sócrates mesmo aponta para a inutilidade da pedagogia mediante uma concepção internalista e metafísica. É de muito maior proveito, além de que experimentalmente subsidiada, a visão analítico comporamental do conhecer, que envolve o estudo da experiência do indivíduo, e que possibilita o desenvolvimento de tecnologias adequadas para o ensino.
É notório que boa parte da retórica de Sócrates está em sua habilidade de conduzir a discussão. Mas sua argumentação, quando aparece, está baseada na hipótese negativa para a explicação dos fenômenos. Hipótese negativa pode ser lida como "se isso não acontece por causa disso, então acontesse por causa daquele outro". Dessa forma, Sócrates vai excluindo certos raciocínos e apresenta algum que, mesmo sem experimentação, recebe estatus de explicação. Devido à natureza complexa dos eventos em discução, provavelmente não haverá como provar que o argumento final de Sócrates não é razoável, mas a hipótese negativa na ciência não explica aquilo que um fenômeno é, explica tudo aquilo que um fenômeno não é. Porém, com relação aos temas abordados por Sócrates no Mênon de Platão, há uma alternativa explicativa muito mais satisfatória na Análise Experimental do Comportamento.
Neste texto de Platão, o Mênon, foram abordados dois aspectos do discurso de Sócrates: seu método de ensino e sua concepção de natureza do conhecimento. Apesar de conduzir muito bem o procedimento de modelagem de comportamentos, Sócrates concebe a natureza de uma forma muito inconsistente segundo uma abordagem behaviorista radical.

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

O Mobilismo, Herácleto de Éfeso

"Este cosmo, igual para todos, não o fez nenhum dos deuses, nem nenhum dos homens, mas sempre foi, é e será um fogo eternamente vivo, acendendo-se e extinguindo-se conforme a medida."

Passarei a decompor agluns elementos dessa frase do poema, analisar questões de significado, questões funcionais, implicações metodológicas mas, em todo o tempo, fazendo referência à minha formação filosófica pessoal. Por isso, peço desculpas a todos por qualquer divergência, mas defendo que qualquer análise trata-se tão somente de minhas humildes opiniões.
A primeira decomposição da citação que analisarei é "Este cosmo, igual para todos (...)". Primeiramente, sinto que a afirmação sugere uma unifomidade de acesso de todas as pessoas ao mesmo ambiente. Essa é minha primeira impressão. Me remete aos ditados "O sol nasce e se põe sobre justos e injustos" e "A chuva abençoa a todos". Mas, de fato, todas as pessoas estariam sujeitas à ação do mesmo ambiente? Não seria ele grande demais e repleto de variáveis atuando simultaneamente que teriam uma ação única a cada instante sobre cada pessoa? Não seria o ambiente novo a cada isntante? Talvez a resposta seja que todos estão sujeitos à mesma diversidade. Mas tenho a impressão que afirmações como a de Herácleto sugiram passividade no ambiente, e é com isso que não posso concordar. É o ambiente que se relaciona, ativamente, com o organismo, e assim se dá o objeto de Behaviorismo Radical: o comportamento.
Sigo analisando a afirmação implicita de que "Este cosmo (...) não o fez (...) nenhum dos mortais". Incluindo o nosso ambiente mais imediato, o planeta Terra, no que Herácleto está chamando de cosmo, não podemos concordar com sua afirmativa. O homem opera sobre o ambiente, o altera. É alterado por ele todo o tempo enquanto se comporta, mas o altera. Podemos dizer, na verdade, que praticamente todo o ambiente a que estamos sujeitos foi feito pelos mortais. Nosso cosmo mais imediato é todo artificial, social, humano.
Considere esse fragmento: "(...) mas sempre foi, é e será(...)". O passado não pode prever o futuro. O futuro pertence ao futuro, e estará sempre lá, confinado ao futuro. Em poucos momentos a flisofia deve ceder à lógica, mas esse é, sem dúvida, um desses momentos. O dado que temos de que algo sempre foi e é de alguma forma, diz apenas isso: esse algo sempre foi e é assim. Não se pode afirmar, por isso, que algo ainda será da mesma forma, somente por que o tem sido.
Porém, no final do texto selecionado para análise, Heráclito diz que "(...) [O] cosmo (...) [é] vivo, acendendo-se e extinguindo-se conforme a medida." E eu não poderia ficar mais contente ao citar Heráclito se não por ler algo tão verdadeiro. A metáfora de universo vivo, que me remete à palavra orgânico, que me faz pensar em intrincadas relações funcionais de eventos, em uma rede de acontecimentos simultâneos que se afetam mutuamente, me parece a base do Behaviorismo Radical e também do mobilismo. Atentar para os muitos aspectos do cosmo se relacionando é o que fará uma pessoa orientada por uma visão behaviorista radical de mundo. E, para mim, isso é belíssimo.

quinta-feira, 6 de dezembro de 2007

As Duas Vias, Parmênides.

Esta primeira análise de um texto clássico foi para mim um presente inesperado. A obra de Parmênides, filósofo pré-socrático, fundador da escola eleática (em Eléia, uma colônia grega no sul da Itália), de V AC., surpreende com uma concepção naturalista de compreensão da realidade, em alguns pontos semelhante (de maneira notável) a uma análise behaviorista radical. Segue um fragmento do poema As duas vias.

“Resta-nos assim um único caminho: o ser é. Neste caminho há grande número de indícios; não sendo gerado, é também imperecível. Possui, com efeito, uma estrutura inteira, inabalável e sem meta. Jamais foi e nem será, pois é, no instante presente, todo, inteiro, uno, contínuo. Que geração se lhe poderia encontrar? Como, de onde cresceria? Não te permitirei dizer nem pensar o seu crescer do não-ser. Pois não é possível dizer nem pensar o que o não-ser é. Se viesse do nada, qual necessidade teria provocado seu surgimento mais cedo ou mais tarde? Assim, pois, é necessário ser absolutamente ou não ser. E jamais a força da convicção concederá que do não-ser possa surgir outra coisa. Por isto, a deusa da Justiça não admite, por um afrouxamento de suas cadeias, que nasça ou que pereça, mas mantém-no firme. A decisão sobre este ponto recai sobre a seguinte afirmativa: ou é ou não é. Decidida está, portanto, a necessidade de abandonar o primeiro caminho, impensável e inominável (não é o caminho da verdade); o outro, ao contrário, é presença e verdade. Como poderia perecer o que é? Como poderia ser gerado? Pois se gerado, não é, e também não é, se deverá existir algum dia. Assim, o gerar se apaga e o perecimento se esquece.” Borheim, G. (Org). Os filósofos pré-socráticos. 7. ed. São Paulo: Cultrix. 1993.

Nesta passagem, Parmênides trata do ser que é e o contrapõe com o não ser que não é, estabelece para o leitor dois tipos de análise da realidade e conclui falando da continuidade do ser talvez sob uma perspectiva lógico-indutiva a partir de eventos que não foram explicitados.
Quanto à definição do ser como “ser que é”, talvez a aparente tautologia envolvida no jogo de palavras dificulte uma análise behaviorista radical. Mas podemos exemplificar o ser, nesse caso, como uma pessoa. Uma pessoa é, existe, se comporta, pensa (se comporta), enfim. Porém acredito que seria difícil não ser contra-argumentado sobre o ser de demais coisas, como na pergunta “então animais não são?”. Acredito que são. Animais existem, se comportam. E as plantas? De certa forma, biólogos podem referir-se a certos comportamentos de plantas. Considerem as águas-vivas. E os demais objetos também podem ser incluídos nessa lista. Penso que o ser de Parmênides faz referência a pessoas, animais, plantas, objetos e, muito importante, faz referência aos nossos comportamentos em relação a eles – comportamento sob controle de estímulos. Pessoas, animais, plantas e objetos me estimulam o tempo todo e me comporto em relação a elas, as olho, busco, pego, percebo. Não posso negá-las. Se peço para chamarem-me o fulano, o chamam. Se eu assobio, meu cachorro vem brincar. Se molho meu vaso de margaridas, elas voltam a vida. Se eu olho (e obedeço) uma placa de transito, evito acidentes. Dessa forma, o ser são as coisas. Elas são ser, bem como eu sou, se posso me comportar em relação a elas.
Porém, seria impossível se comportar em relação a coisas que não são o ser? Uma análise sincera nos diria que sim. Mentiras, ficções explanatórias, regras mantidas por aquiescência, enfim, são exemplos de comportamento verbal que podem ser estímulos em relação aos quais nos comportamos. Podem ser regras (no caso, falsas-regras). O problema é que segui-las costuma ser prejudicial a longo prazo. Uma pessoa pode manter a castidade ou sentir culpa por não mantê-la devido a contingências sociais – mas o preço é o sofrimento, isolamento, mentiras. Ser casto pode ser aprovado pela comunidade, mas as implicações afetivas podem fazer sofrer o celibatário – este é só um exemplo entre milhares possíveis. A função das afirmações de Parmênides quanto ao não-ser, no texto, podem ser de estabelecer que ele aprovaria sempre que pessoas seguissem regras que realmente tratem da realidade (rastrear), mas que ele não aprovaria ou criticaria o seguir regras que só são mantidas pela aprovação das outras pessoas (aquiescer). A argumentação dele pode esconder um julgamento de valor entre rastrear e aquiescer. Se Parmênides o faz, o faz bem, posto que cabe mesmo à filosofia esse julgamento. A ciência só pode tratar dos dados relativos a cada tipo de regra. Talvez o único problema na obra dele seja considerar o aquiescer como impossível. Aquiescer é possível, porém crítico.
Não sei com base em que dados, mas Parmênides acertadamente discute a continuidade do ser e pressupõe a existência real natural - e não metafísica - do mundo sob análise. Esse princípio subsidia uma compreensão científica do mundo, como na Análise Experimental do Comportamento. Há uma ordem contínua entre os eventos: evolução, mutação, reação, inércia, reforço, modelagem, enfim. O próprio comportamento é contínuo e apenas recortado para estudo. É multideterminado e não se pode ainda conhecer todas as variáveis – tudo aquilo que explica o porquê alguém se comporta. Ainda faz referência ao caráter não teleológico, ou seja, não orientado para o futuro do ser. Uma pessoa não faz algo, não pensa, não cria, porquê quer fazê-lo, tem vontade ou tem um objetivo. Para o behaviorismo radical, é a história passada que altera a probabilidade de um comportamento. Uma pessoa é modificada e passa a se comportar de certa forma diante de certo contexto. O que “acontecerá” não existe nesse sentido. Isso faz oposição a outros pensamentos que definem o comportamento como que orientado para o futuro.
No mais, o texto de Parmênides me parece muito coerente segundo uma abordagem behaviorista radical. Eu me comporto em relação a mim mesmo e às demais coisas, e essas coisas existem em um mundo real – me estimulam. Outras coisas não existem, como as coisas a que se referem às falsas-regras, e posso até me comportar em relação a estas, mas a um preço alto. É melhor rastrear do que aquiescer. O mundo está integrado em uma continuidade, o que é confirmado por abordagens científicas. O próprio comportamento é contínuo, muito embora não esteja pré-determinado ou possa ser orientado para o futuro. De forma geral, há muita concordância entre o behaviorismo radical e o texto de Parmênides e quisera o pensamento filosófico de toda a história tivesse permanecido nesse viés.

quinta-feira, 29 de novembro de 2007

Uma Proposta Experimental

A primeira digressão a ser apresentada fará menção à criação desse blog e contribuirá para a delimitação das possibilidades das análises que aqui serão apresentas. Creio que a divulgação dos acontecimentos causadores provavelmente não seriam bons exemplos de altruísmo e, no mais, não me sinto ainda à vontade de fazê-lo. Porém, o efeito desses eventos em mim - face a minha história - me deram algumas idéias e, ao final da cadeia, estabeleceram a construção desse espaço. Gostaria de passar a divulgar algo do que pensei durante o processo.

Estive envolvido em uma procura de como registrar minhas leituras de textos filosóficos, compartilhá-las e, o mais importante, conhecer as leituras que outras pessoas fariam das minhas. Em pensamento, publiquei-as em comunidades, em fóruns de discussão, em grupos, mas já em pensamento não fiquei satisfeito com o possível resultado de nenhuma dessas opções. Lembrei-me de blogs de amigos que visitei recentemente e então disse a mim mesmo: "- É isso! Vou criar um blog!" (cabe dizer que esse processo não explica porque estou criando o blog, apenas descreve algumas coisas que aconteceram juntamente com o criar). Bem... claro que não sei se foi a melhor estratégia. Terei que passar pela experiência e os efeitos dela é que serão os maiores mantenedores do digredir. Por isso se trata de uma proposta experimental.

Mencionei que a digressão estará baseada nas minhas leituras de tratados de filosofia. Bem, e será. Além disso, tantarei sempre apontar relações com o behaviorismo radical. Tentarei tratar os temas tal qual um behaviorista os vê. B. F. Skinner costumava traduzir algumas passagens tradicionais em termos de uma análise comportamental, apontava o mentalismo que aparecia em discussões filosóficas e apresentava uma alternativa derivada da análise experimental do comportamento e de outras contribuições científicas. Não sou um filósofo, mas tentarei fazê-lo e, óbvio, haverá opiniões divergentes - tomara. Talvez a melhor conseqüência de publicar minhas leituras será derivada das críticas e comentários feitas por outros leitores. Será a modelagem do meu filosofar.

Neste blog, as discussões serão feitas com a transcrição de textos de autores clássicos (juntamente com a citação das fontes), seguido pela minha leitura, talvez haja citações de textos behavioristas e, por fim, a haverá espaço para comentários de visitantes.

Em suma, estarei aqui para reler textos filosóficos tradicionais em termos de uma análise comportamental. Todos são bem vindos a contribuir. Críticas serão entendidas como contracontrole - e quero estar aberto para que estas regulem meu modo de escrever. Análises complementares em comentários me serão modelos. Reler será auto análise.

Pode isso dar errado?